domingo, 20 de julho de 2014

TRISTEZA NÃO PAGA DÍVIDAS (DONA ELZA DO CAROÇO) – DANDO CONTINUIDADE À PESQUISA ARTÍSTICA


por Rose Mara da Silva




Neste ano nosso projeto tem como ação oficinas de aprimoramento técnico para os artistas envolvidos, até este momento fizemos as oficinas de: Dança dos Orixás, com Yáskara Manzini; e Teatro de Rua, com Cléber Borges.
Esse processo tem me colocado ante a milhões de inquietações sobre os caminhos que estamos trilhando, onde queremos chegar, o que nos interessa dos temas pesquisados pelo coletivo, etc, etc, etc... Essas milhões de dúvidas que surgiram nos motivaram a dar continuidade ao processo de pesquisa e compartilhamento de conhecimento que iniciamos no ano anterior, em cada momento uma pessoa do coletivo vai postando suas percepções, descobertas, etc, e assim, construímos um banco de dados sobre os assuntos que temos pesquisado. Segue aqui um relato sobre um livro que tem ampliado de forma muito significativa as minhas impressões sobre a questão do “tradicional”, o uso da “rua” na manifestação artística e cultural, e a “ resistência” presente nas manifestações da cultura popular brasileira.





Referências

As referências que compartilho hoje chegaram até mim por conta da leitura do livro Música do Brasil, de Hermano Vianna, da Editora Abril Entretenimento. Nesse livro Hermano nos coloca ante as características de transformação e mobilidade presentes na tradição, o aspecto “antropofágico” - no mesmo sentido que Oswald de Andrade enunciava – das brincadeiras, nas quais tudo o que aparece inusitadamente é imediatamente incorporado e resignificado dentro daquele contexto. Vianna também escancara a periferia, o interior, os lugarejos longínquos e invisíveis para os homens de poder como celeiros da inventividade humana, lugares onde as expressões artística são questões de sobrevivência, de onde o sujeito forja sua personalidade e por vezes sua identidade. É um livro muitíssimo interessante, de onde tiramos algumas referências que vou dividir com vocês nessa e nas próximas postagens.



Resistência

“Não há olhar neutro sobre nenhuma realidade. […] Por trás das brincadeiras está também a alegria de brincar.
[…] Peço desculpas aos tristes e aos que acham que só a melancolia é bela, chique ou politicamente correta. Peço desculpas não. Estou me lixando para seus ensinamentos, ou suas enfadonhas lamentações. Prefiro a companhia de Oswald de Andrade: a alegria é a prova dos nove. Prefiro a proximidade dos brincantes brasileiros, aqueles incontáveis que me disseram nunca ter sentido tristeza na vida. No início eu não acreditava nessas declarações: achava que estavam me escondendo seus verdadeiros sentimentos, ou que não tinham coragem de revelar seus verdadeiros sofrimentos. Depois achei que estava em jogo diferentes concepções de alegria.
Felizmente deixei de lado essas suspeitas. Percebi que aquelas pessoas sabiam exatamente o que estavam falando. Elas conheciam mais do que ninguém, o que era tristeza. Por isso tinham dedicado sua vida para combatê-la. Sua alegria também não era alienação, não obscurecia a visão da miséria do cotidiano (posso ter me esquecido de dizer: a maioria das pessoas aqui retratadas são classificadas como miseráveis em estatísticas “oficiais” de várias procedências). Pelo contrário: sua alegria existe apesar da miséria; sua alegria resiste à miséria (que fique bem claro: a miséria nunca pode ser condição da alegria), para não deixar que aquilo que é miserável tome conta de todo o seu mundo, de sua vida. A brincadeira é um caminho para a iluminação: o longo aprendizado da arte do bem viver.”

É através destas e algumas outras palavras que Hermano termina seu escrito, resumindo para nós a questão da resistência presente em todo o livro, e nós fazendo refletir profundamente sobre a importância dos brincantes brasileiros, e da preocupação destes em manter vivas suas brincadeiras.

Abaixo seguem vídeos informativos sobre algumas das brincadeiras documentadas no livro*:


Dança do Caroço - Tutóia Velha/ Maranhão:




Dança do Parafuso - Lagarto/ Sergipe:









Carimbó - Pará:







* Dividi esse post em partes, nas próximas postagens teremos outros vídeos e questões presentes nas brincadeiras.

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